terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Tumulto - Cecília Meireles

Tempestade... O desgrenhamento
das ramagens... O choro vão 
da água triste, do longo vento, 
vem morrer-me no coração.

A água triste cai como um sonho,
sonho velho que se esqueceu...
( Quando virás, ó meu tristonho
Poeta, ó doce troveiro meu!...)

E minha alma, sem luz nem tenda,
passa errante, na noite má,`
à procura de quem me entenda
e de quem me consolará...

Retrato - Cecília Meireles

Eu não tinha este rosto de hoje, 
assim calmo, assim triste, assim magro, 
nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força, 
tão paradas e frias e mortas; 
eu não tinha este coração que nem se mostra. 
Eu não dei por esta mudança, 
tão simples, tão certa, tão fácil: 
Em que espelho ficou perdida a minha face?

Serenata - Cecília Meireles

Permita que eu feche os meus olhos,
pois é muito longe e tão tarde!
Pensei que era apenas demora,
e cantando pus-me a esperar-te.
Permita que agora emudeça:
que me conforme em ser sozinha.
Há uma doce luz no silencio,e a dor é de origem divina.
Permita que eu volte o meu rosto para um céu maior que este mundo,
e aprenda a ser dócil no sonho como as estrelas no seu rumo.

Canção de Outono - Cecília Meireles

Perdoa-me, folha seca, 
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo, 
e até do amor me perdi.

De que serviu tecer flores
pelas areias do chão, 
se havia gente dormindo 
sobre o própro coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando àqueles 
que não se levantarão...

Tu és a folha de outono 
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...

Entrevista com Clarice Lispector - Panorama



Era Nova

Antes tarde do que nunca
O que é do lar, pro lar retorna
Depois de uma espera moribunda
Depois de um tempo em demora
Jamais desejo que isso aconteça
Que confisque e permaneça
Com as alegrias de outrora

Sei que não vou ouvir uma só palavra
Do vocabulário quando a Roda girou
Mas lembrarei das palavras altas
Do escárnio e maldizer
Que me faz assim querer
O que era bom esquecer

A cada passo à frente
Deve-se estar preparado para o próximo passo
Não há como se dar o mesmo passo
Pois ele ficou pra trás
Cravado no chão do Tempo, e não mais

Qual será o próximo passo?
Agora não há mais corrente, nem enlaço
À frente, a luz do Sol, somente
O Azul Universal de minha semente
É o que da força e o que me faz.